Primeiro achei que o casal que vi a ler ao longe não era português e abordei-o em inglês. E o que é que justifica esta atitude? O facto de ter estado a falar com a Iris, que é alemã, uns minutos antes? Ou o ambiente da Ribeira do Porto pejado de turistas? Por muitas justificações que arranje, o que me influenciou foi algo tão superficial e falacioso quanto o aspeto do Manuel a da Virgínia. Julguei-os pelo seu ar e foi com surpresa que ouvi o Manuel dizer que era português.
Depois, também à medida que me aproximava deles, meti na cabeça que o livro que a Virgínia tinha nas mãos era um guia de viagens e quando me aproximei ainda mais achei que afinal era um dicionário. E por que raio tirei esta conclusão quando nem tive a oportunidade de olhar convenientemente para a capa do livro? Parti, portanto, do princípio que só o Manuel estava a ler um livro daqueles que interessam ao Acordo Fotográfico e foi ao Manuel que expliquei o que pretendia, ignorando por completo a Virgínia. Nem mesmo quando o Manuel perguntou à Virginia se se importava de ser fotografada me apercebi que estava a esquecê-la injustamente.
Por último, a cereja no topo do bolo: quando chegou o momento de entregar o marcador do Acordo Fotográfico fui indelicada ao ponto de entregar um marcador apenas ao Manuel. Pior: só me dei conta do que fiz muitas horas depois, já em casa, a ver as fotografias no computador. Por tudo isto, cara Virgínia, se ler este texto peço-lhe que aceite as minhas desculpas. Espero bem que voltemos a encontrar-nos um dia para poder entregar-lhe o marcador a que tem direito.
Só depois de tiradas as fotos, quando perguntei ao Manuel o que lia, é que me foi explicado que ambos liam o mesmo texto filosófico: Ensaios de Amor, de Alain de Botton. O Manuel estava a lê-lo em português pela primeira vez, e a Virgínia estava a relê-lo numa edição romena. Tinham decidido ler o mesmo livro ao mesmo tempo para terem a oportunidade de trocarem impressões em cima do acontecimento (como ilustra a foto), partilhando assim um tema de conversa.
Volto, portanto, ao início deste texto. Afinal, eu não estava assim tão errada quando à existência de "algo estrangeiro" naquele quadro. Por muito difícil que fosse identificar esse "algo", houve um conjunto de pequeníssimos elementos que o meu cérebro detetou à distância e interpretou, permitindo-me numa fração de segundos construir uma primeira impressão. E desculpem-me este texto secante, mas acho tudo isto fascinante! A culpa é deste livro, que li há alguns anos mas cujos ensinamentos não esqueço.
Por último, a cereja no topo do bolo: quando chegou o momento de entregar o marcador do Acordo Fotográfico fui indelicada ao ponto de entregar um marcador apenas ao Manuel. Pior: só me dei conta do que fiz muitas horas depois, já em casa, a ver as fotografias no computador. Por tudo isto, cara Virgínia, se ler este texto peço-lhe que aceite as minhas desculpas. Espero bem que voltemos a encontrar-nos um dia para poder entregar-lhe o marcador a que tem direito.
Só depois de tiradas as fotos, quando perguntei ao Manuel o que lia, é que me foi explicado que ambos liam o mesmo texto filosófico: Ensaios de Amor, de Alain de Botton. O Manuel estava a lê-lo em português pela primeira vez, e a Virgínia estava a relê-lo numa edição romena. Tinham decidido ler o mesmo livro ao mesmo tempo para terem a oportunidade de trocarem impressões em cima do acontecimento (como ilustra a foto), partilhando assim um tema de conversa.
Volto, portanto, ao início deste texto. Afinal, eu não estava assim tão errada quando à existência de "algo estrangeiro" naquele quadro. Por muito difícil que fosse identificar esse "algo", houve um conjunto de pequeníssimos elementos que o meu cérebro detetou à distância e interpretou, permitindo-me numa fração de segundos construir uma primeira impressão. E desculpem-me este texto secante, mas acho tudo isto fascinante! A culpa é deste livro, que li há alguns anos mas cujos ensinamentos não esqueço.
4 comentários:
O que tu captaste é uma ternura.
É, não é Vespinha? Ao menos tirei uma boa foto. :)
interessante, A.F.
já tinha pensado nesta questão de fazer a abordagem em inglês por os "tirar pela pinta", mas pareceu-me ineficiente pq 1) podem não ser portugueses mas falar ou pelo menos perceber portugues e 2)podem ser portugueses e eu achar que não são.
por isso, eu nunca abordo em inglês, sempre em português; só se necessário é que mudo.
eh lá. por que é que os dicionários não interessam? questionar não interrompe nem invalida a leitura enquanto crescimento. um dicionário não é um outsider, nem é um livro menor. posso passar horas a ler o dicionário à procura de palavras com um certo som. para depois as usar num texto. em que quero palavras com um certo som. ou posso consultar um dicionário à procura de palavras em português que me permitam traduzir um poema de que gosto e que está noutra língua. e leio muito gramática quando tenho uma dúvida. num e noutro caso são leituras que me dão prazer, não são meramente leituras técnicas. e são leituras que aumentam a minha intimidade criativa com o português. dicionários e gramáticas não são um manuais de instruções >: palavras são unidades ricas, são pequenas histórias ultra densificadas sobre como um povo associa sons a coisas e como escolhe nomear essas coisas.
e os guias de viagens: viajar é ler culturas.
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